DEFICIÊNCIAS E SUAS EFICIÊNCIAS
No final do ano de 2005 me matriculei numa escola inclusiva para pessoas
com deficiências visuais. Meu diagnóstico era cegueira em ambos os olhos e minha
leitura era Braille e a mobilidade tinha que ser através de bengala.
Foi um momento doloroso para minha família. E quanto a mim? Às vezes eu
pensava que estava sonhando, que era um pesadelo...
Eu não sabia que o pior estava por vir. As pessoas que me conheciam
passaram a me tratar de uma forma diferente, era como se eu além de ter perdido
a visão não pensasse, não raciocinasse.
Eu me tornara uma alegoria, onde passava as pessoas faziam esse tipo
pergunta:
- Por que não leva ela para São Paulo?
Ou então:
- Por que vocês não fazem uma promessa com santa Luzia?
Na Escola, passei a observar (ouvindo) meus colegas de sala de
aula. Era
uma sala de Reabilitação para adultos e todos eram muitos alegres, contavam
piadas sobre cegos, e a palavra cegueira sempre foi falada com naturalidade.
Passei a viver a pior situação que um ser humano pode vivenciar: O
PRECONCEITO.
Daí passei a amar a palavra DEFICIENTE.
O riso da criança que nunca enxergou o sol, a piada do jovem que além de
cego é cadeirante, a música cantada por dona Francisca com mais de 80 anos,
cega. A psicóloga cega, Carmen Menezes, contadora de histórias, o engenheiro
elétrico professor de Informática, Paulo Roberto com baixa visão e também poeta,
e também nossa professora Ivanice, com suas próteses de olhos verdes combinando
com seu cabelo castanho claro.
Em 2008 a Sociedade de Assistência aos Cegos (SAC) criou uma Academia de
Letras e Artes, ALASAC e eu fui uma das fundadoras na área da Literatura, pois
escrevia contos, poesias. Em 2010 com ajuda da SAC lancei meu livro
infanto-juvenil AS AVENTURAS NOTURNAS DE SONECA E BOCEJO.
Nossa academia reúne hoje 28 membros nas áreas de Literatura, Teatro,
Dança, Música e Artes Plásticas.
O Brasil continua "dormindo em berço esplêndido" nas questões
de cidadania com a pessoa deficiente.
Essa população discriminada e rejeitada pela sociedade é cidadã e VOTA.
Não precisamos do seu olhar de piedade, assumimos nossas limitações mas reivindicamos
nossos direitos de ir e vir como qualquer outro cidadão.
Mesmo sem enxergar queremos ir ao shopping fazer nossas próprias
compras, pois também somos consumidores, a loja de magazines, ao supermercado,
onde além do despreparo para atendimento a esse público, não temos uma
engenharia voltada para a área que se chama Acessibilidade.
Hoje nosso trânsito desenfreado e mal educado deixa milhares de pessoas
com deficiências motoras, neurológicas. Sem contar o número de bebês que nascem
com má formação óssea, visual, motora, auditiva.
E aí? O que faremos com essa população. Voltar ao tempo da
Roma e Grécia Antiga. Aprisionar essas pessoas em quartos escuros, edificando um "puxadinho", porque a sociedade "normal" fica
penalizada ao ver um jovem empunhando uma bengala ou sentado numa cadeira de
rodas.
Essa mesma população que nos olha com indiferença vai ficar idosa e irá
ter a necessidade de rampas, pisos táteis...
O cego na porta da igreja com uma latinha pedindo esmolas pertence há um
passado bem distante, hoje as tecnologias avançam com leitores de tela,
programas com síntese de voz que nos dá acesso à internet, redes sociais.
Hoje dia 21 de Setembro se comemora o DIA NACIONAL DA LUTA DAS PESSOAS COM
DEFICIÊNCIAS.
Deixe seu preconceito de lado e olhe em sua volta que convivemos num
país com extensões físicas continentais e o nosso vizinho pode ser um NEGRO,
GAY, CEGO, EVANGÉLICO, VICIADO.
A verdadeira cidadania é nos olharmos de uma forma linear, nos ajudando
como uma sociedade madura a vencer as barreiras, para que possamos viver uma
verdadeira INCLUSÃO SOCIAL.
21/09/14
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